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Fatos Históricos

Planos Econômicos Pós-1985

Planos Econômicos Pós-1985

Conteúdo postado em 21/07/2017

Com o processo de redemocratização, o principal aspecto econômico a ser solucionado era a crescente inflação que assolava a população brasileira. A partir de 1984, o Brasil retomou o crescimento econômico graças ao êxito da maxidesvalorização, promovida no fim do período militar, aliado à recuperação das contas externas por meio de um acordo com o FMI em 1983. Esse crescimento, entretanto, foi acompanhado por uma inflação crescente que, já no fim de 1985, atingia a marca de 235% ao ano. Com a intensificação do problema, diversos diagnósticos foram sugeridos para as causas dessa inflação.

 

O principal embate entre os diagnósticos inflacionários do período diziam respeito a qual seria a caraterística central da inflação. O pensamento econômico tradicional explica o aumento de preços como resultado do aumento da demanda, logo, em uma economia mais aquecida, há uma tendência natural de ocorrer um processo inflacionário. Essa tese, entretanto, passa a ser questionada já que, no período de baixo desempenho do PIB, entre 1981 e 1983, a inflação continuou alta.

 

Surge, então, a explicação da inflação inercial, que leva em conta a realimentação do aumento de preço com base na inflação anterior. Dessa forma, os sucessivos reajustes de preços por que passou a economia brasileira desde a década de 1960 (indexação econômica) levaram a um processo inflacionário cujo principal componente era inercial, ou seja, a expectativa de aumento de preços levava em consideravam o aumento passado, criando uma inflação crescente que não estava necessariamente ligada ao poder de compra ou à reserva de valor da mercadoria em si. Levando em consideração esse debate econômico, o governo brasileiro promoveu a sucessivos planos econômicos que tentaram controlar a perda do poder de compra da população.

 

1) Plano Cruzado/1985

cruzadosO primeiro plano do governo Sarney levou em conta apenas o diagnóstico da inflação inercial. Por isso, focou em medidas que evitassem a manutenção da expectativa de preços crescentes. Assim, o plano instituiu uma nova moeda, o Cruzado (que teria mais credibilidade), fixou o câmbio desvalorizado (de forma a impulsionar as exportações) e congelou os preços, que seriam reajustados apenas a partir da autorização do governo federal.

 

Para desindexar a economia, o governo extinguiu as Obrigações Reajustáveis do Tesouro Nacional (ORTN), títulos públicos instituídos na década de 1960, substituindo pela Obrigação do Tesouro Nacional (OTN), com valores congelados por um ano. Com a nova moeda, o governo pode corrigir contratos antigos, o que foi feito de forma defasada (através da chamada tablita), garantindo que o governo pagasse menos que deveria se mantivesse as obrigações da ORTN, evitando a continuação das expectativas crescentes.

 

O índice de preços foi alterado para não levar em consideração o último mês anterior ao plano, de forma a ficar também defasado (patamar inferior), e os rendimentos das poupanças passam a ser trimestrais, de forma a evitar a despoupança pela percepção de redução do rendimento nominal. O Plano Cruzado também instituiu o congelamento salarial após a recomposição dos salários com base na média dos 6 meses anteriores. Para evitar a inflação de demanda, o congelamento ficou abaixo do índice de preços.

 

Para que o salário acompanhasse as eventuais flexibilizações de preços, foi instituído um gatilho salarial: um reajuste defasado para se a economia saísse do padrão congelado. Um aspecto importante desse gatilho é que ele somente seria acionado se a inflação chegasse a 20% e, independente da variação de preços, a variação salarial seria somente os mesmos 20% estabelecidos.

 

O Plano Cruzado foi um sucesso inicialmente: alcançou a estabilização completa, conseguindo praticamente zerar a inflação nos meses seguintes, além de reduzir o desemprego. O aumento do emprego e do poder de compra da população fez com que o consumo aumentasse sem que houvesse um aumento da oferta na mesma proporção, tanto por causa da menor capacidade ociosa quanto pelas pressões sobre os produtores por causa do preço final congelado, levando a uma escassez de produtos. A falta de mercadorias leva à contaminação da economia pelo ágio, valor extra cobrado para a venda dos produtos, que passou a funcionar como uma inflação camuflada, exaurindo o congelamento.

 

Na tentativa de desacelerar o consumo, o governo promoveu o Cruzadinho (1986), um pacote fiscal que esfriaria a demanda por meio da redução da renda disponível ao criar impostos sobre alguns produtos, como gasolina e automóveis, que levantariam recursos para um plano de investimentos em infraestrutura e metas sociais. O plano fracassou grandemente, gerando aumento de preços e a tentativa do governo de expurgar os seus efeitos do índice de preços para evitar que o gatilho salarial fosse acionado, o que gerou grande descontentamento com o pacote proposta.

Uma semana após as eleições de 1986, foi anunciado o Plano Cruzado II, um novo pacote fiscal que visava aumentar a arrecadação do governo.

 

Entre as medidas anunciadas estavam: aumento tributário, que seria positivo não só para ajustar as contas públicas como também para diminuir o poder de compra acelerado; reajuste de preços em produtos finais específicos, para evitar repasses de aumento de preços na cadeia produtiva; remarcações de algumas tarifas, como energia elétrica, correios e telefones. Esses reajustes acabaram funcionando como uma válvula de escape ao congelamento de preços o que levou à elevação da taxa de inflação e ao acionamento do gatilho salarial já em janeiro de 1987. O fim do plano Cruzado foi decretado no mês seguinte, quando se extinguiu o congelamento de preços. A piora das contas externas levou à moratória dos juros externos em 1987, reduzindo a entrada de capitais.

 

2) Plano Bresser/1987

Com base nos erros cometidos no Plano Cruzado, um novo pacote econômico é desenvolvido, levando em consideração que a inflação é causada tanto por um componente inercial quanto por um componente de demanda. O diagnóstico híbrido deu origem ao Plano Bresser, que buscava promover um choque deflacionário que contivesse elementos ortodoxos e heterodoxos. As medidas ortodoxas incluíram políticas contracionistas (fiscal e monetária) e a defasagem dos índices de inflação. Já as medidas heterodoxas incluíram a flexibilização do congelamento de preços, com travas em patamares determinados; a indexação dos salários com base na Unidade de Referência de Preços (URP), determinada pela média dos meses anteriores, suavizando o impacto e deixando a correção salarial defasada ao índice geral de preços. O câmbio não foi fixado e sofreu micro-desvalorizações no período.

 

Mesmo com a contração econômica, o Plano Bresser não consegue conter a inflação que atinge quase 600% ao ano. O fracasso leva à formulação de novas medidas econômicas baseadas na identificação do problema inflacionário como sendo apenas causado pela demanda excessiva, gerada pelo enorme déficit público. Os proponentes do Choque Ortodoxo (1988) entendiam que a economia brasileira funcionava no curto prazo, não havendo, assim, a possibilidade de um componente inercial nesse processo. Com isso, é proposta uma política ortodoxa gradual, que previa um longo período de contração econômica (também chamado de “sangramento econômico”) de forma a atrair reservas e estabilizar a economia antes de liberar as variáveis econômicas. As medidas também não são bem sucedidas: em um ano, a inflação sobe para mais de 800% ao ano.

 

3) Plano Verão/1989

Com o fracasso do choque ortodoxo, percebe-se que há, realmente, um componente inercial na inflação brasileira. O diagnóstico híbrido é retomado com o Plano Verão, que se assemelha bastante com o Plano Bresser, porém com algumas importantes 02-cedulas-do-brasil100500-cruzados-novosc206209-fesob_iZ74XvZxXpZ1XfZ75891457-425979539-1.jpgXsZ75891457xIMdiferenças: extinguiu todas as formas de indexação (OTN e URP) e instituiu um congelamento indefinido (não gradual) de preços e salários. Entre as medidas ortodoxas encontravam-se a restrição de crédito, limitação de títulos públicos e redução de despesas. Também foi criada uma nova moeda, o Cruzado Novo, e o câmbio manteve-se não-fixado (crawling peg).

 

Devido a dificuldades políticas e ao descredito do governo após sucessivos planos fracassados, a contração fiscal prevista não ocorreu e nem mesmo os altos juros foram capazes de controlar a antecipação do consumo (receio de eventual aumento de preços leva ao aumento do consumo). Como não haviam mecanismos de indexação, não havia um mecanismo de coordenação de expectativas, o que levou a uma explosão inflacionária: no início de 1990, alcançava mais de 80% ao mês (mais de 1000% ao ano).

 

4) Plano Collor/1990

O primeiro presidente eleito diretamente assume o cargo em meio a essa turbulência econômica e com perspectivas de piora significativa (com previsões de aumento inflacionário de 5.000% ao ano). Além disso, a falta de apoio parlamentar dificultaria a promoção de mudanças econômicas significativas. Mesmo assim, logo no início de seu mandato, ele anuncia o Plano Brasil Novo (que fica conhecido como Collor I) a partir de novo diagnóstico híbrido da inflação.

 

O novo plano, entretanto, inova ao inserir uma terceira variável às causas inflacionárias: além da inflação de demanda e da inercial com base nas expectativas em relação a preços e custos, o Plano Collor I identifica uma inflação inercial gerada no comportamento bancário nas relações de empréstimo. De acordo com a equipe econômica, devido aos ciclos de oscilação dos juros, os empréstimos realizados pelos bancos seguiam um padrão que levava ao encarecimento do investimento privado, que era, dessa forma, repassado ao preço final do produto, impulsionando a inflação.

 

Cédula_500000_Cruzeiros_Mário_de_Andrade_AnvRev.jpgCom base nesse diagnóstico, o Plano Collor instituiu diversas medidas que remetem aos processos anteriores, como o reajuste oficial de salários (uma forma de reedição da URP), a proibição de reajustes de preços (ou seja, congelamento), alongamento de prazos dos títulos públicos, substituição da moeda (reedita o Cruzeiro) e taxas livres de câmbio com forte intervenção do Banco Central (não era mais crawling peg). As grandes inovações foram a criação de certificados de privatizações, que visava a diminuição da dívida pública (mas que encontrou dificuldade nesse período), e o bloqueio dos ativos financeiros das pessoas físicas e jurídicas.

 

Essa medida foi a mais controversa: determinava a proibição de saque acima do limite de 50 mil cruzados novos (aproximadamente US$1.200 à época) por 18 meses com reajuste de 6% ao ano (ou seja, nada, já que a inflação mensal era muito superior a isso). Apesar das duras críticas recebidas, não foi toda a população que sentiu fortemente os seus efeitos, já que há uma baixa tendência para poupar no Brasil. Os maiores afetados foram a população de alta renda, os aposentados e os bancos, que eram o foco dessa medida. Com o bloqueio, buscava-se evitar o aumento de preços por meio do investimento: com o sequestro de liquidez, a capacidade de empréstimos dos bancos diminuiu, evitando a chamada ciranda financeira. Com a diminuição de investimentos, geraria a contração econômica e redução da inflação.

 

No primeiro momento, há forte redução da inflação (de 80% para 10% ao mês) aliada a grande contração econômica. A forte oposição do setor bancário e do empresariado, contudo, é grande e percebe-se uma aceleração da inflação nos meses seguintes. Para tentar controlar o processo inflacionário, foi editado o Plano Collor II, que buscava manter a inflação no patamar de aproximadamente 20% por meio de redução de gastos públicos e modernização da produção industrial. O governo também extinguiu todas as formas de indexação, instituindo a Taxa de Referência (TR), um mecanismo de correção monetária que se basearia nas expectativas do governo ao invés da inflação passada.

 

Apesar de ter conseguido controlar a inflação por alguns meses, a crise política que levou ao impeachment do presidente Collor acabou por prejudicar a continuidade do plano. Com a ascensão do vice Itamar Franco, uma nova equipe assumiu a responsabilidade pela estabilização econômica do país e conseguiriam alcança-la, dois anos depois, com a criação do Plano Real (mas esse papo fica pra outro dia).

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